Apesar das previsões pouco animadoras para a economia brasileira em 2022, o mercado de caminhões deve continuar crescendo no próximo ano – depois de registrar substancial avanço na casa dos 50% em comparação com 2020. O agronegócio segue sendo a maior mola propulsora do setor, com apoios importantes da construção civil, mineração e entregas urbanas. Ainda assim, as limitações para atender a demanda por falta de componentes eletrônicos seguirá segurando o desempenho dos fabricantes.
A avaliação foi compartilhada pelos participantes do painel “A rota de aceleração dos caminhões”, que integrou a série de apresentações ao vivo do primeiro dia do Automotive Business Experience, o #ABX21, realizadas na manhã da terça-feira, 23.
Com mediação do repórter Bruno de Oliveira, de Automotive Business, participaram do painel Alcides Cavalcanti, diretor executivo da Volvo Caminhões; Roberto Leoncini, vice-presidente de vendas e marketing da Mercedes-Benz; e Sérgio Pugliese, diretor de vendas da Volkswagen Caminhões e Ônibus (VWCO). Todos manifestaram preocupações quanto ao desempenho amarrado das linhas de produção (por falta de semicondutores) e baixo crescimento econômico, mas foram unânimes em dizer que 2022 será mais um ano de expansão para o mercado nacional de caminhões. Contudo, ninguém arrisca dizer quanto.
Convergência sobre crescimento
“A indústria de caminhões é movida a PIB, mas existem fatores positivos, como a introdução (obrigatória por lei) dos motores (diesel) Euro 6 em 2023, que podem provocar uma antecipação moderada de compras. O agronegócio também deve continuar a crescer. Por isso prevemos um ano de crescimento, mas ainda não arriscamos dizer quanto”, afirmou Alcides Cavalcanti, da Volvo.
Roberto Leoncini, da Mercedes-Benz, indicou que a fabricante tem expectativa de crescimento do PIB na casa de apenas 1% em 2022. Ainda assim, acompanhou os demais participantes do painel no #ABX21, prevendo mais um ano de alta nas vendas de caminhões no País.
“Mas há muitas dúvidas sobre o ano que vem. Uma delas é como a alta dos juros vão impactar o mercado, principalmente nos financiamentos de veículos seminovos, que ficam difíceis, mais caros, e isso acaba impactando as vendas de novos também. Outro fator é a relação de preços: se os seminovos sobem menos do que os zero-quilômetro, isso desestimula o cliente a renovar a frota”, pondera Roberto Leoncini.
Sérgio Pugliese, da VWCO, também reconhece que o baixo desempenho do PIB e a alta constante dos custos são ameaças ao crescimento do mercado de caminhões, pois afetam todos os setores da economia.
“Temos uma visão positiva para 2022, mas claro que a alta dos juros exercem pressão adicional sobre os custos e nem todos conseguem repassar isso aos preços, o que pode inibir o mercado”, afirma Sérgio Pugliese.
Na opinião dos participantes do painel, o agronegócio vai continuar dando as cartas mais altas do mercado de caminhões em 2022, impulsionando o segmento de modelos pesados, que este ano representam mais de 50% das vendas e cresce 56%, acima da média do mercado (48%).
Mas os executivos também apostam em vendas maiores de semipesados, para aplicações de construção civil (betoneiras) e transporte intermunicipal de mercadorias diversas, um segmento beneficiado pelo crescimento do e-commerce, que também aquece a demanda por caminhões leves e semileves. “Na pandemia o consumidor se acostumou a comprar on-line e deve continuar. Conheço transportadores que faziam uma entrega por dia e hoje fazem três para o mesmo cliente”, destaca Leoncini.
Euro 6 antecipa compras, mas não como em 2011
Para todos os participantes do painel, a adoção de motores Euro 6 no Brasil para atender à nova fase da legislação de controle de emissões veiculares para veículos pesados, o Proconve P8 que entra em vigor a partir de janeiro de 2023, deverá sim provocar antecipações de compras de caminhões Euro 5, puxando as vendas para cima em 2022, mas não na mesma proporção que ocorreu em 2011, quando a adoção do P7 em 2012 provocou uma corrida às concessionárias e o recorde do mercado de caminhões no País jamais superado, com 178 mil unidades vendidas.
“O impacto do Euro 6 em 2022 será muito diferente do que foi [o Euro 5] em 2011, porque naquele ano não houve falta de com componentes e de estoques como agora. Por isso no ano que vem as montadoras não têm como atender uma pré-compra muito forte”, opina Pugliese.
Leoncini vai na mesma linha de pensamento, concorda que os fabricantes não conseguiriam atender uma alta súbita da procura por caminhões, mas avalia que isso não deve acontecer: “Os clientes têm maior maturidade hoje, eles não fogem mais da tecnologia. Além disso, os preços já estão bastante estressados e o mercado não espera por aumentos tão significativos com o Euro 6”, pondera.
“Já temos algumas previsões de antecipações de compra por causa do Euro 6 em janeiro de 2023, mas a situação é bem diferente de 2011. Não temos mais tantas dúvidas sobre a distribuição de diesel [com baixo teor de enxofre] nem com [a solução de ureia] Arla, que provocaram uma alta exacerbada das vendas em 2011”, avalia Cavalcanti.
Falta de componentes e limitações na produção
Antes de pensar no crescimento de 2022, no entanto, a indústria de caminhões ainda luta para conseguir atender toda a demanda de 2021, já que a produção segue abaixo da procura, afetada pela falta de componentes, principalmente semicondutores, um problema que só deve melhorar depois do meio do próximo ano.
“Todo dia precisamos entender o que acontecerá no dia seguinte com o abastecimento de componentes, principalmente semicondutores, o que não deve ser resolvido antes do meio de 2022. Temos muitos problemas logísticos e altas de custos sem precedentes, que eu nunca tinha visto, como aumento do aço de 100%. Temos atrasos nas entregas e não estamos conseguindo atender todos os pedidos”, relata Leoncini, da Mercedes-Benz.
A estimativa é de um mercado de 120 mil caminhões vendidos no Brasil este ano, mas poderia ser mais se não fosse pela falta de componentes. “Temos surpresas diárias com falta de suprimentos que provocam microparadas não programadas das nossas linhas, o que tentamos compensar com horas extras. Toda a indústria está sofrendo com alta de custos e falta de semicondutores e outros insumos”, afirma Cavalcanti, da Volvo.
“Entre São Bernardo do Campo (SP), Curitiba (PR) e Resende (RJ) só muda o endereço dos fabricantes, os problemas são os mesmos”, diz Pugliese, da VWCO. “Temos perdas significativas de produção. Não conseguimos atender todos os clientes e aproveitar o crescimento do mercado. Mas estamos conseguindo sobreviver em meio às dificuldades”, resume.